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quarta-feira, 16 de novembro de 2011

R$ 4,85

" Um suco de abacaxi, por favor." - Pedi a atendente do balcão que usava um batom de cor forte que pouco combinava com sua expressão de má vontade.
Ela devia ter uns 38 anos, mas quem julgasse pelas marcas que o tempo havia deixado em seu rosto, dava mais que isso.
"É 4,85. Vai querer mais alguma coisa?" -                          Dizia enquanto arqueava uma das sobrancelhas em uma ameaça implícita de que eu não deveria querer mais nada. Quase me arrependi de ter escolhido ali pra tomar o suco.
" Não, obrigada. Só isso mesmo. " - Sorri tentando buscar alguma simpatia da dona da boca cor de malva. Foi em vão.
Peguei meu suco e sentei na mesa encostada na janela. Queria que ninguém me notasse. Eu só estava interessada em abacaxi no momento.
Revirei o meu pequeno buraco negro, mais conhecido como bolsa, e peguei a sacola recém saída da livraria e abri o romance comprado, e comecei a lê-lo.
Enquanto começava a entender a narrativa do livro, e me familiarizar com a escrita da autora..senti aquela coisa estranha. Não, não.. o suco caiu bem no meu estômago. Era outra coisa.
Sabe quando você se sente uma presa? E que qualquer movimento em falso pode ser fatal?  Aquela sensação de estar sendo observada. Eu sabia exatamente onde estava a pessoa a me observar, mas me faltava coragem para levar meu olhar até ela.
Continuei a olhar pro livro, com um repentino desinteresse nas palavras que estavam escritas nele. Meu observador continuava com seu procedimento, enquanto a curiosidade estava cada vez mais desperta em mim. A única coisa que meus olhos podiam ver sem focar nele, era sua camisa azul marinho e as mãos cruzando-se, um sinal claro de ansiedade.
Não me parecia ameaçador. Talvez ele também se sentisse uma presa. Mas demonstrava isso de maneira repulsiva. Tomei coragem e levantei meu olhar. Forcei ao meu cérebro para que levasse um ar de distraída as minhas feições. Torci para que tivesse dado certo.
O olhei. Belos olhos castanhos se encontraram com os meus, enquanto lábios - ainda mais belos que os olhos- se reprimiam em um quase sorriso. Pelo menos pareceu um quase sorriso pra mim.
Me encantei. E o semblante dele também demonstrava encantamento. Isso tudo durou uns 3 segundos, até a timidez me fazer desviar o olhar e focá-lo novamente ao livro. Meu suco tinha terminado já fazia tempo, até a espuminha já tinha sumido. Era hora de ir.
Coloquei o livro dentro da bolsa e me levantei. Passei por ele e novamente nossos olhares se encontraram. Me senti tremer por dentro.
Saí do restaurante. E me perguntei...por mais quantas vezes eu desperdiçaria chances como essa.

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